terça-feira, 19 de maio de 2020

Por que eu escrevo

Sempre que tento ser mais artístico e poético ao escrever eu falho miseravelmente. Na verdade, eu tenho dificuldades em escrever nos conformes técnicos. Além de que é muito clichê.

Mas eu também me questiono por que escrevo. Creio que seja porque eu tive vontades em minha vida que não foram completamente atendidas, daí eu coloquei minha ansiedade nas letras. Eu escrevo porque minha vida é como um pássaro numa gaiola, se debatendo; e que, na impossibilidade de rasgar os céus, desenhou seu voo num papel e usou a palavra que o fizesse. Eu escrevo porque se não for a palavra, eu estarei perdido em mim mesmo e não terei para onde ir: a palavra cria portas, faz pontes. Eu escrevo porque tudo que eu pedi a deus não me fora atendido e, como consequência, inventei minha realidade. Eu escrevo porque agora há pouco estava sofrendo sem razão – ou por razões abafadas -, mas ao vir aqui debulhar letrinhas acho que talvez eu encontre paz e uma possível saída nos meandros das frases, sílabas e períodos. Eu escrevo porque não há ninguém para conversar no momento. Eu escrevo porque já se esgotaram as preces e deus já deve estar deveras incomodado com orações repetitivas. Eu escrevo porque quero me comprometer, porque quero sentido, responsabilidades; mas ao mesmo tempo quero ser livre para escrever quando e o que eu quiser. Eu escrevo porque desde criança eu gostei de escrever e aos 15 anos eu tive um diário. Eu escrevo para me consolar, porque eu releio meus textos e eles falam sozinhos, pois possuem sua própria personalidade: são cartas de mim para mim. Eu escrevo porque tenho a superstição de que a realidade será alterada pelos meus textos. Eu escrevo para que alguém leia essas palavras e me mande uma mensagem agradecendo por eu lhe ter salvo a vida, pelo menos naquele momento. Eu escrevo porque a esperança é reescrita quando eu quero. Eu escrevo porque agora mesmo estou tendo uma experiência culminante, onde a vida em sua mais profunda manifestação se faz viva e clara dentro de mim. Eu escrevo porque algo pede que eu o faça: eu preciso sobreviver. Eu escrevo porque a realidade é muda: eu preciso dar voz ao mundo. Eu escrevo porque tudo que eu já tentei ser deu errado, mas a escrita é a única coisa que a vida não me pode negar. Eu escrevo para não morrer: guardar as palavras é algo mortal. Eu escrevo porque há milhões de anos os dinossauros existiram, porque um ovo tem sentimentos e porque o mundo foi criado segundo os princípios da dor e que com ela temos uma dívida. Eu escrevo porque já fui longe demais até aqui e já estou distante de tudo que me faz uma alma humana. Estou à beira de descobrir o mistério do mundo e resolver todo esse problema como numa revelação divina. Eu escrevo porque quando eu morrer ainda haverá uma parte de mim que vive e que não se pode matar. Eu escrevo porque a solidão é como uma queimadura de óleo quente que é aliviada com água fria, mas que em seguida volta a arder. Eu escrevo porque quero deixar claro quem sou, mas nem tanto, porque não se pode saber quem se é com clareza: o eu é turvo e embaçado, somos assim. Eu escrevo porque sei que você também busca uma palavra ou um verso que te diga o que fazer com sua vida a partir de agora. Mas eu sinto muito, eu não posso te ajudar nem me ajudar. Eu não sei o que fazer comigo mesmo, sou uma pessoa perdida, sem bússola, sem orientação. Eu escrevo porque eu sei que escrever, por hora, é tudo que tenho; é tudo que sou.


domingo, 17 de maio de 2020

Reflexões sobre meu diário de 2010

    Outro dia, eu estava folheando meu diário antigo de 2010, quando eu tinha 15 anos, e que durou até 2014, ano em que eu estava com 19. Havia tantas coisas bobas, típico de uma mente adolescente, é claro. Eu ri muito pelo conteúdo ridículo e cômico muitas vezes. Porém, a gente muda muito e não dá pra dizer ao certo o porquê disso, pois minha vida sempre se manteve nas mesmas condições por muito tempo; mas suponho que a mudança seja uma necessidade intrínseca do ser humano. Tudo muda. Nada é, tudo está.
    No entanto, é interessante observar como algumas coisas são difíceis de se desvencilhar. Alguns traços a gente carrega conosco até não sei quando. Parece que muitas das coisas que nos são negadas ficam lá no fundo da alma sepultadas e esquecidas, como num cemitério, mas sempre clamando por serem ouvidas e ressuscitadas, com um grito meio abafado pela vergonha de ser. Mas elas são e estão lá, mesmo que as neguemos.
    Há coisas que ainda busco, é claro. Mas acho que não convém falá-las aqui. É muito denso, difícil de dizer... Mas eu gostaria de deixar um escrito do meu diário, que data de 21 de Agosto de 2013:

É preciso falar o que se sente para não enlouquecer. Eu aprendi isso hoje. Talvez seja por isso que as pessoas oram: não por que acreditam que exista deus, mas porque precisam desabafar...
Em algum lugar, em um exílio nos confins da terra, há alguém que fala sozinho, que clama por ser ouvido...
Há um grito oculto em cada ser que respira
Há uma pergunta não respondida
Há uma melodia não concluída
Há uma ponte inacabada
Há uma frase encerrada
Uma saudade reprimida
um desejo profundo e oculto
Há uma chance negada, uma paz roubada
E há também sentimentos inestimáveis que não se podem transcrever.
 
É isso, gente. Valeu.
 
 
 
 
 

domingo, 23 de fevereiro de 2020

A felicidade que eu quero

Eu tomei uma decisão hoje em minha vida, depois de uma autorrevelação do mais profundo do ser. Eu decidi imaginar a minha felicidade e vivê-la. Mas isso não seria fugir da realidade? Não. O fato de ser imaginado não quer dizer que não exista. Se eu existo, eu imagino. Minha imaginação existe. Sem contar que nossos pensamentos coordenam nossas ações, e estas, por conseguinte, modificam a realidade.

Mas me deixe contar como eu quero ser feliz.

Eu quero uma felicidade daquela exagerada, porém suficiente. Sim, com todo esse paradoxo. 
Eu quero uma felicidade adiante e além, daquelas que a gente não achava que existia.
Quero a felicidade do desconhecido, do primeiro encontro, da primeira sensação da descoberta do mundo.
Quero uma felicidade daquelas de doer no peito, de tão grande, de tão satisfatória, de tão plena, única e insubstituível.
Quero a felicidade dos dias cinzas e azulados, aqueles que quando chove dá uma vontade de se recolher e mergulhar em si mesmo.
Eu quero a felicidade da solidão, do vazio, do nada, do oco, do vácuo, porque a solidão é uma condição humana, e tem dias que tudo que nos resta é o nada, e é aí que a felicidade é testada: ser feliz é também abraçar a própria solidão.
Eu quero a felicidade do fim, porque tudo que traz felicidade tem um fim e aceitar isso é ser feliz.
Eu quero a felicidade da saudade, porque eu sei que o que passou foi bom.
Quero a felicidade da imperfeição: a felicidade é imperfeita.
Quero a felicidade daquilo que eu sinto mas que ainda não sei dizer, daquilo que está dentro de mim, que estou gestando, que é inefável. Existem coisas no nosso interior que ainda somos incapazes de dar nome, nem a psicologia tem competência para isso.

Espero que um dia eu possa reler tudo isso e me orgulhar de ter vivido assim. Mas talvez nesse momento eu já tenha uma outra ideia de felicidade. Minha felicidade é um reticência: adiante e além... Já não basta escrever, é preciso viver, mentalizar, fazer disso uma ideologia, uma religião: a felicidade. No entanto, tudo isso pode não passar de uma vontade rarefeita que o mundo e a vida apagam num sopro mínimo. Não importa, eu já fui feliz por saber o que quero, mesmo que de forma imprecisa. Ser feliz é algo self, de si mesmo, algo que vem da gente, que parimos. É o nosso fruto que oferecemos ao mundo e a nós mesmos, e depois o comemos. Mas a minha felicidade sempre será clandestina, fora da lei, porque eu exijo muito da vida. E ela também exige muito de mim.